Em tese que sistematiza uma análise
semiótica dos livros do Antigo Testamento, Mariza Mendes (2009) se rende ao
que chama de “sentidos ocultos” presentes nos textos.
Ao concluir a crítica, a autora observa: “O
discurso que se manifesta nos livros do Antigo Testamento está cheio de
sentidos ocultos, que nos fascinam e nos escapam, não permitindo nunca uma
apreensão definitiva”.
O Livro do Eclesiastes pode ser considerado
um destes textos instigantes sobre os quais se debruça a utora. A certa
altura, aparece um fragmento com o seguinte teor: “Antes que se rompa o fio
de prata”.
Entre as interpretações que se pode dar à
expressão, ocorre a ideia de que se há algo expressivo que
deva ser feito, não se deve perder muito tempo em não fazê-lo.
Estudos paleográficos apontam o século III
a. C. como o período mais verossímil para a composição dos escritos do
Eclesiastes. O fato de o texto ser atribuído ao rei Salomão faz alguns
pesquisadores o colocar em época mais antiga. Às vezes não se tem muita
clareza da época em que determinado texto bíblico foi escrito.
Ao ler “Confissões” de Santo Agostinho,
percebe-se que o teólogo era fascinado por muitos textos do Antigo
Testamento. Os sentidos ocultos dos textos foram muitas vezes perseguidos
pelo teólogo. Um dos fragmentos do Eclesiastes apreciados por aquele Doutor
da Igreja, fala do sentimento de eternidade que Deus teria deixado no
coração do homem: “Tudo fez Deus formoso no seu tempo;
também pôs a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir as
obras que Deus fez desde o princípio até o fim”.
Por outro lado, pessoas que nunca leram o
texto costumam surpreender-se com expressões que se identificam com as
mensagens presentes no livro. Algumas são muito conhecidas como: “Tudo tem
seu tempo [...] tempo de nascer, tempo de morrer...”, ou “nada há de novo
debaixo do sol”, ou ainda, “vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. A
metáfora do “cordão de três cordas” continua sendo utilizada com o propósito
de lembrar que uma atitude solidária é mais consequente do que um estilo
egoísta. Outra metáfora presente no discurso do “Pregador” é aquela que fala
de “vestes brancas”, atributo desejável para desfrutar algumas coisas boas
da vida, como alimentar-se e beber o vinho com alegria ou desfrutar a vida
com a mulher que se ama.
No texto é possível perceber que a força do
novo deslumbrava a todos, menos o autor.
O mundo continuava cheio de injustiças, a
tomada do poder político não garantia mudança, a riqueza e a razão
filosófica continuavam enganosas e ao final, ricos e pobres, sábios e
ignorantes, humildes e arrogantes, partiam todos para um mesmo lugar.
De um realismo aparentemente exagerado, em
determinado trecho faz algumas indagações que auxiliam a refletir sobre o
contexto da obra:
“Quem sabe o que é
bom para o homem durante sua vida, ao longo desses dias contados de sua
existência fugaz? Quem mostrará ao homem o que vai acontecer depois dele
debaixo do sol?”
Questões levantadas pelo autor do
Eclesiastes e que na sua visão precisariam ser respondidas em tempo:
“Antes que se
rompa o fio de prata, e se despedace a copa de ouro, e se quebre o cântaro
na fonte, e se parta a roldana do poço e o pó volte a terra, como antes, e o
espírito volte a Deus, seu autor”.