Isso vai criar jurisprudência!
Uma candidata no
concurso para soldado da Polícia Militar da Bahia conseguiu
adiar a entrega de alguns exames que não pôde fazer no prazo estipulado
em edital porque estava no último mês de
gravidez. A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
anulou a desclassificação da candidata, garantindo-lhe a fixação de nova
data para entrega dos exames e, em caso de aprovação nessa etapa, a
participação nas fases seguintes do certame.
No julgamento de recurso em mandado de
segurança impetrado pela candidata, os ministros decidiram que, se os
exames representarem risco para o feto, como os que exigem o uso de
radiação, a candidata gestante pode entregá-los após a data definida no
edital do concurso. A decisão da Sexta Turma, unânime, segue
entendimento novo na Corte, apresentado pelo relator, ministro Sebastião
Reis Júnior. Os precedentes que amparam a decisão são do Supremo
Tribunal Federal (STF).
Segundo o processo, já no último mês de
gestação, a candidata deixou de entregar três
dos 28 laudos exigidos, pois os exames (radiografia, teste
ergométrico e exame preventivo) poderiam
prejudicar o feto. Ela compareceu na data estabelecida pelo
edital para entrega dos laudos e se comprometeu
a apresentar os restantes logo após o parto, em novembro de
2007. A etapa seguinte do concurso estava marcada só para janeiro de
2008, mas, mesmo assim, a candidata foi
eliminada da seleção.
Ela impetrou mandado de segurança, mas o
Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) considerou que o edital do concurso
não admitia tratamento diferenciado entre os candidatos, incluindo a
realização posterior de provas ou exames devido a alterações
psicológicas ou fisiológicas temporárias como gravidez, contusões e
outras. Para o tribunal, não haveria direito líquido e certo no caso.
Razoabilidade
No recurso ao STJ, a
candidata alegou que a eliminação ofendeu o princípio da
razoabilidade, pois ela compareceu na data marcada e
só não apresentou três laudos, por recomendação
médica. Já a Subprocuradoria-Geral da República se posicionou
contra o recurso, alegando que cláusulas de edital só podem ser
impugnadas por mandado de segurança no prazo de 120 dias, contados da
publicação oficial.
No seu voto, o ministro Sebastião Reis
Júnior apontou inicialmente que o encerramento do concurso ou a
homologação do seu resultado final não impediriam o julgamento, sob o
risco de perpetuar um abuso ou ilegalidade. Também afirmou que
a jurisprudência consolidada do STJ é no
sentido de que não é possível dar tratamento diferenciado a candidatos
devido a alterações fisiológicas temporárias, especialmente
se há desrespeito às regras do edital.
Porém,
segundo ele, o caso tem peculiaridades:
“A candidata deixou de apresentar três exames
dos 28 exigidos, sob orientação médica, em razão de que tais
laudos representariam exposição a perigo ou
possibilidade de acarretar dano à saúde do feto, mas
compareceu no dia marcado para entrega dos exames, oportunidade em que
se comprometeu a apresentá-los, antes mesmo da realização da fase
seguinte”.
Tratamento diferenciado
O ministro destacou que recente
entendimento do STJ garante tratamento diferenciado à candidata
gestante, sem que isso viole o princípio da isonomia. Contudo, afirmou
que essa tese se aplica aos casos em que não houver indicação expressa
no edital contrária à participação de gestantes, sendo que no caso
julgado havia a restrição.
Apesar do entendimento do STJ (de garantir
tratamento diferenciado às gestantes) não alcançar os concursos cujos
editais expressamente disponham sobre sua eliminação pela não
participação em alguma fase, o ministro disse ter a convicção de que
a gravidez não pode ser usada para fundamentar
qualquer ato administrativo contrário aos seus interesses ou para
prejudicar gestantes, pois elas têm proteção garantida na Constituição
Federal.
Para o relator, a melhor solução é a que
foi adotada pelo STF em casos análogos. À luz do princípio da isonomia,
a gestante não estaria em igualdade de condições com seus concorrentes,
devido à impossibilidade médica de realizar os exames. O STF afirmou ser
possível remarcar exames físicos para candidatos em situação diferente
dos demais, “por estarem temporariamente acometidos de infortúnios, ou
em razão de motivo de força maior”.
Processo: RMS 24800
FONTE: STJ